Ainda me lembro da primeira vez em que te vi. Foi na capa de um jogo pirateado para Playstation 2. Peço desculpas quanto a pirataria. Mas o orçamento de um pré-adolescente não me dava muita opção. Você estampava aquela capa. Tive a curiosidade de escolher o seu time. Não sabia quem você era, mas deveria ser bom, já que era a capa do jogo. Você jogava com o Shaquille O’Neal no Miami Heat. Eu também não sabia que naquela época o Shaq jogava no Miami Heat. Junto com o Alonzo Mourning. Quando criança, eu sempre gostei do Alonzo Mourning, mesmo sem tê-lo visto jogar. Porque o primeiro nome dele era quase o meu sobrenome (era com “z” ao invés de “s”). Na época eu não gostava do meu sobrenome, mas gostei de saber que havia outra pessoa com o nome parecido. E lá estava você junto com Shaq e Zo. Você era um “highflyer”, o que significava que poderia fazer grandes jogadas em direção à cesta. E eu fui conquistado. Por você e pelo time. Decidi que a partir daquele dia, eu torceria para o Miami Heat. Era injusto dizer que eu torcia para o Chicago por causa do Michael Jordan. Justiça seja feita, eu nunca tinha visto o Jordan jogar além do filme Space Jam. Sem saber, no mesmo ano em que eu escolhi torcer para o Miami Heat, a franquia ganhou o seu primeiro campeonato. Liderada por você.

Ainda me lembro da primeira vez em que assisti a um jogo seu. De verdade, transmitido pela televisão. Não me recordo contra quem era, nem qual foi o placar. Mas ainda me lembro da euforia que tomou conta de mim ao descobrir que eu poderia acompanhar a NBA em tais dias na programação da TV à cabo. E lá estavam você, Shaq, Zo e todos os outros. Não foi um bom ano para a franquia. Mas eu comecei a acompanhar os jogos. Comecei a torcer de verdade como jogo nenhum de futebol havia tirado essa torcida de dentro de mim até então. E aqui no Brasil, futebol, sabe como é…

Ainda me lembro da primeira vez em que eu acreditei que o Miami Heat poderia correr atrás de mais um campeonato. Me lembro da apresentação em que estavam com você Chris Bosh e Lebron James. Pensei que levantaríamos um troféu. Aliás, não um troféu. “Não dois, não três, não quatro, não cinco”… Infinitas possibilidades. Para o seu time, para o nosso time. E fiquei surpreso comigo mesmo com o quanto eu poderia amar tanto uma equipe de uma cidade a milhares de quilômetros de distância. Uma torcida que eu só via pela televisão. Um ícone que eu só chegaria perto comprando merchandising raríssimo por essas bandas.

Por isso mesmo eu ainda me lembro da primeira vez em que eu vi sua camisa numa loja. Eu mal podia acreditar. Era um dia tão legal que eu simplesmente me recusava a acreditar que pudesse melhorar. Uma amiga da faculdade veio até o subúrbio para jogar (veja só você) basquete comigo e com a minha galera. E aí que de repente, a gente andando pelo shopping local, lá está. A sua camisa. Eu sequer hesitei. Eu tinha que tê-la. Para usar, para vestir, para estampar o número “3” nas minhas costas. Para ser você. Para jogar como você o máximo que eu conseguisse. Como uma criancinha se veste com a fantasia do seu super-herói favorito. Era eu com a sua camisa. Por cada quadra, com a mesma intensidade, a mesma paixão. Eu faria aquele chão e aquelas tabelas serem completamente meus enquanto eu estivesse usando a sua camisa. “This is my house”.

Ainda me lembro quando vieram os títulos. Adiados por uma temporada, é verdade. Mas vieram. Me lembro de comemorar, de vibrar, de gritar o máximo que eu pude. De tremer com aquela bola de três do Ray Allen. De fingir ser parte do time. De abraçar a “Heat Nation”. De procurar você na tela da televisão e só pensar: “esse cara merece tanto tudo isso”. Ainda me lembro de ir para a cama abraçado com a sua camisa, de novo, feito uma criancinha enrolada em seu cobertor. Mas feliz. Tão feliz. E só posso pensar que não há nada mais puro do que o esporte, as sensações que ele traz, que você traz, que me fazem sentir tão explicitamente feliz e emocionado.

One Last Chance

Ainda me lembro de quando recebi a notícia de que você viria com o Miami Heat jogar aqui no Brasil. No Rio de Janeiro. Minha cidade. Eu simplesmente não podia acreditar. Eu, que sempre sonhei em assistir a um jogo da NBA, já tivera essa oportunidade no ano anterior também aqui no Rio. Mas agora seria diferente. Seria o Miami Heat. Com você. Você que é o responsável por isso tudo. Ia estar bem aqui. A poucos metros de distância. E fiz questão de que fossem realmente poucos metros. Busquei os assentos mais próximos da quadra. Fiquei atrás da imprensa, atrás do Jax, o repórter de Miami. Fiz cartazes. Recebi vários chutes nas costas porque eu tapava a visão de quem estava atrás por causa dos cartazes. Nem liguei. E pouco pude fazer para conter a emoção quando você e o time entraram em quadra. Era real. Estava acontecendo. E aconteceu da melhor forma possível.

Ainda me lembro da série de playoffs contra o Charlotte Hornets na pós temporada 2015-2016. Me lembro da pura emoção, da tensão, da torcida. Cada jogo crucial. E você. Você aconteceu. Você foi o jogador que sempre foi. Decisivo, impactante, determinante. O que desequilibra. Ainda me lembro de gritar a cada cesta. De chorar, sim, chorar. Com recordes sendo quebrados, com séries sendo viradas. E você em quadra. Do lado, Michael Jordan. Aquele Michael Jordan. E você em quadra.

Ainda me lembro quando começaram os rumores. De que você ia embora. Me lembro de especular, de analisar motivos, contra e a favor. De pensar “ok, eu entendo os motivos dele caso ele vá embora. Estou pronto”. De me enganar. Porque eu jamais poderia estar pronto para isso. Para o símbolo do Miami Heat deixar o Miami Heat. Algo como as estrelas saírem da bandeira dos Estados Unidos. Não fazia muito sentido. Mas precisava, não é mesmo? Negócios. Família. Relacionamentos. A vida continua. E vou me lembrar de pegar a sua camisa (aquela camisa) e deixar estendida em meu quarto durante uma semana inteira. De dormir abraçado com ela outra vez, mesmo sem título nenhum para comemorar. Só queria me sentir vencedor outra vez. Vencedor como você.

Ainda me lembro de ver você voltando e não acreditar enquanto ao mesmo tempo dizer a mim mesmo que era claro que você estava voltando, porque era o único destino possível. Miami. Wade County. Father Prime. Braços abertos. E depois, mais uma chance. Mais uma temporada maravilhosa. Mais um All Star Game. Mais muitos momentos memoráveis e game-winners para os vídeos daqueles momentos para sempre. Mais camisas para serem trocadas.

This is your house

Ainda me lembro, como se fosse ontem… não, espera. Pra falar a verdade, foi ontem sim! Ainda me lembro de estar sentado na minha poltrona favorita, me derramando em lágrimas e vendo você disputar a sua última partida na NBA. Aquela em Brooklyn, onde você marcou um triplo-duplo e onde todos gritavam o seu nome mesmo fora de casa. Eu sei. Eu também gritei o seu nome aqui. Uma última dança.

E por isso tudo eu vou me lembrar, Dwyane Wade. De tudo que você representou para mim e para tantos outros fãs de basquete ao redor do mundo. Obrigado por tudo. Por tudo que me ensinou, por tudo que me proporcionou durante os anos em que vestiu a camisa do Miami Heat (AQUELA camisa). Li a sua carta de despedida tomado pela emoção. Portanto, me sento no dever de escrever a minha carta para você. Obrigado pelo amor pelo jogo. Viva os melhores momentos do mundo com sua família. Sucesso.

Do Brasil, Rio de Janeiro. Com amor e respeito,

Renan Alonso

One Last Dance