Vocês viram que o Dwyane Wade se aposentou? Loucura. Não tanta loucura quanto você, meu caro leitor, não saber quem é Dwyane Wade. Se não sabe, vai lá procurar, eu espero. Viu só que grande jogador do Miami Heat, tricampeão da NBA, símbolo da franquia e homem bonito é o Dwyane Wade? Pois é. O Dwyane Wade, meu grande ídolo do basquete, jogou sua última partida como jogador profissional da NBA com direito a tudo: turnê de despedida, camisas trocadas, homenagens, etc. Há quem diga inclusive que ele poderia tranquilamente jogar ainda mais uma temporada, quem sabe duas. Ele muito educadamente disse que não, que era hora de parar.

Modéstia à parte, eu sei muito bem qual é a verdadeira razão do Dwyane Wade resolver se aposentar. Não importa a versão que foi dada aos veículos de imprensa, pode confiar que eu conheço a verdade. Dwyane Wade resolveu se aposentar após 16 temporadas de basquete porque não aguentava mais as pessoas vindo a ele perguntando “mas você ainda joga basquete?”. É batata, pode confiar. Acontece o mesmo comigo.

Quer ver só? É eu encontrar algum conhecido na rua, trocar um “oi, como vai?”, daqueles que pouco interessa a resposta. Reina o desassunto. Aí o tal conhecido cisma de querer puxar uma conversa que não vai a lugar algum e manda: “mas você ainda joga basquete?”. O engraçado é que a pessoa também não está interessada na resposta, mas por alguma razão faz cara de surpresa quando eu respondo que sim. “É mermo?”, se espanta. Como se houvesse algum motivo plausível para eu não jogar basquete, assim como o Dwyane Wade também não tinha nenhum, pode confiar. Só que ele entregou os pontos. Aí o sujeito das duas uma: se ele jogava basquete comigo antes ele manda um “tô querendo voltar”, que eu sei que é mentira; ou se ele nunca jogou basquete comigo antes agora mesmo é que ele não vai começar a jogar.

Entendo o amigo do desassunto, pois se eu não entendesse de desassunto eu não estaria escrevendo crônica para início de conversa. Também entendo o Dwyane Wade por ter se aborrecido com esse tipo de pergunta e ter resolvido aproveitar os milhões que a carreira lhe rendeu. Só peço que me entendam também, pois eu não pretendo parar de jogar e ainda faço isso de graça por algum motivo. Só que tudo tem o seu preço no fim das contas. A diferença básica entre o Dwyane Wade e eu é que ele tem o suficiente para pagar o preço que for. Já eu…

Enquanto escrevo isso, sinto umas pontadas no meu joelho. O nome disso? É joelho, oras. Só que mais a fundo tem uma condromalácia (saúde). Uma inflamação na cartilagem, como o próprio nome já diz, é claro. Essa inflamação é tratada a médio prazo, e o médio prazo pode ser mais longo do que médio. Correr agora já não é das tarefas mais simples, mas ainda tenho fé que é só alguém gritar “assalto” e o meu joelho vai se lembrar como é que faz. Saltar também tem sido complicado e, conforme a ciência do esporte demonstra, se a base do seu arremesso (as pernas) está comprometida, o seu arremesso também vai ser comprometido no fim das contas. Eu gostaria muito de dizer que esse meu estado vai comprometer o mercado de jogadores, que a minha contratação vai ser avaliada como um risco e os times vão procurar outras opções para fortalecer os seus elencos. Só que a grande verdade é que ninguém além de mim dá a mínima pelo meu joelho e o desemprego no país vai continuar aumentando com ou sem joelho.

Sendo eu o único interessado na situação, tomei isso como um sinal dele, do tempo. Aquele momento de triste verdade onde a gente é obrigado a admitir: já não sou mais o mesmo. Acontece com todo mundo, uma hora ou outra. Só que ao invés de olhar para trás eu preferi encarar de outra perspectiva e imaginar o que vem adiante: uma hora o tal do joelho melhora e a vida segue. Eu, louco que sou, volto para as quadras o quanto antes e continuo respondendo às mesmas perguntas das mesmas pessoas sem assunto. E citando uma célebre ex-chefe do Executivo (não me perguntem os motivos): “a gente não estabelece uma meta, deixa em aberto”. Se eu puder, chego ao nível dos já folclóricos velhinhos do Aterro do Flamengo. Dê um pulo lá naquelas quadras aos fins de semana, caro leitor, e saberá do que eu estou falando. Pessoal tudo de cabeça branca com uns arremessos super calibrados. Se eu puder, eu chego lá. E com cabelo ainda!

Então vai ter aquele momento. Aquele, você sabe ao que me refiro. Não vai ser como o Dwyane Wade, é claro. Imagino que seja até melhor. Vai ser como um estalo, um piscar de vaga-lume ou um aviso do metrô de “portas se fechando”. Eu vou estar em quadra com meus muitos anos e vou saber, nesse estalo, que vai ser a hora de parar. Finalmente. Vou tirar os meus tênis e carregá-los comigo. Não sei se vou sair sozinho de quadra. Quem sabe abraçado com filhos, ou com netos, ou com os dois. Vou me virar e lá estarão à beira da quadra todos eles. Todos os amigos que fiz jogando ao longo desses anos vão estar lá para me cumprimentar. Como eles chegaram lá? Não faço ideia. Mágica ou Uber, um dos dois. Vou abraçar essa galera e inclusive no meio deles tenho certeza de que vou encontrar um daqueles sem assunto que vai me perguntar se eu ainda jogo basquete.

Pela primeira vez eu vou poder responder: agora não mais.

Igual ao Dwyane Wade.

Nosso querido Cristian Pedroso e a família na despedida do seu filho Mateus, que hoje joga nos EUA. Curitiba – Paraná